quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Do gerenciamento de crise para a gestão de risco: o papel do comunicador

Uma crise pode afetar ou destruir a reputação, a imagem, o clima organizacional, a confiança de seus clientes e a credibilidade de uma empresa ou instituição, pública ou privada, por vários anos. Pode também afetar seus resultados econômicos e financeiros, assim como trazer prejuízos profissionais a seus funcionários. É ainda uma grande arena de opiniões e percepções e por este motivo constitui um tema de evidente importância para os comunicadores organizacionais.

Crise é uma mudança súbita, decisiva, em geral desfavorável, com agravamento de uma situação. Em geral, leva a uma ruptura de uma situação de equilíbrio. Crise é um permanente duelo de credibilidade, de pessoas ou grupos com opiniões antagônicas sobre acontecimentos, podendo ser repentinos ou evolutivos. Para alguns especialistas, do ponto-de-vista comunicativo, crise não é fato, é o desdobramento do fato dependendo do seu gerenciamento. Como fatores de influência, estão o alcance territorial da corporação envolvida, a globalização, a ação invasiva da tecnologia na rotina empresarial e a proliferação dos meios de comunicação de massa. As crises abalam tanto os ativos tangíveis quanto intangíveis do patrimônio da organização, e muitas vezes com efeitos duradouros. A questão da interligação mundial via economias e telecomunicações potencializa a relevância do tema, porque as extensões dos conflitos tendem a ser amplas. Por isso, o gerenciamento e comunicação de crise e de risco assume importância estratégica na vida das empresas e dos profissionais e precisa estar incorporado à filosofia.

A crise global levou a uma crise individualizada nas empresas, chegando à crise pessoal de cada um dos milhões de desempregados no mundo. É um processo evolutivo, que cresce em função de contextos. O mau gerenciamento de crise, sem as ferramentas adequadas, leva ao aprofundamento do problema ou à geração de outros. Uma estrutura formalizada no tema, com equipe treinada, é o caminho ideal. Somente sistemas formais de gerenciamento conseguem dar suporte às organizações para reduzir possibilidades de crises ou extensão dos danos, padronizando atitudes para enfrentar uma diversidade de percepções e monitorar o abalo à confiança. O sistema de gestão pereniza a empresa, a partir do desenvolvimento da cultura corporativa, dentro da atividade econômica.

Basicamente, uma gestão de crise é composta por cinco elementos, que devem ser tratados simultaneamente: 1) gerenciamento de contingências (situações cotidianas chamadas distúrbios operacionais), 2) gerenciamento da crise (cuidado com os desdobramentos dos fatos), 3) comunicação durante a crise (contato articulado com os stakeholders atingidos e interessados, de maneira imediata para não potencializar boatos ou fontes não-oficiais), 4) “issues management” (gerenciamento de riscos e oportunidades), 5) comunicação de risco (notificação clara sobre potencialidade de problemas), e 6) continuidade do negócio. A preparação para a crise permite estar num nível de organização de dados e informações e num nível de energia para superação dos impasses, podendo gerar grandes oportunidades logo depois. É indicado proceder um mapeamento e uma análise das partes interessadas, que possam se tornar aliadas ou detratoras, ou mesmo serem futuros parceiros para readequação de produtos e processos e até da forma de condução dos negócios. Teoricamente, todas as crises podem ser evitadas. Ou se não, devem ser contidas e mitigadas, sendo que grande parte do processo decorre da rapidez de reação e de combate de sintomas, reais ou não. Além disso, é preciso sempre tratar o caso de um ponto-de-vista de humanização, não de cifras materiais ou econômicas.

VITIMIZAÇÃO - Toda crise gera vítima, física, moral ou emocional, e dependendo do tratamento do assunto, também gera o fenômeno da “vitimização”, com a indignação das pessoas envolvidas repercutindo o problema de maneira intensa e ganhando adesões. Há ainda um agravamento quando os envolvidos são formadores de opinião. Consultores da área sugerem que seja sempre feito um “de-briefing” em todas as situações vividas pela empresa em seus sistemas internos de comunicação (SAC, documentos, encaminhamentos) e em fontes externas (gravações de TV e rádio, publicações em jornais e internet) para mapear os passos tomados e permitir uma análise e novo planejamento para casos futuros. Afora questões negativas duradouras, que podem ser evitadas com esta técnica de disciplinamento, há uma vigilância forte da opinião pública sobre questões empresariais, como a ética, os valores sociais e excessivo foco em quantificações financeiras. Há um comportamento esperado junto a públicos interno e externo, e planos de gerenciamento demonstram responsabilidade social, porque garantem empregos, impostos, abastecimento.

Acima de qualquer análise de cenários e impactos e de estratégias comunicacionais, entre as regras para administrar bem a crise está não mentir e respeitar a verdade. Informar objetivamente, ser rigoroso na verificação dos fatos e ser ágil está na lista de atribuições. Entre os trabalhos que envolvem o gerenciamento de crises corporativas estão auditórios pré e pós-crise, levantamento de vulnerabilidades, desenvolvimento de plano detalhado, formação e treinamento de time, organização, preparação e manutenção de sala especial e guia dos primeiros instantes. Na seqüência, há preparação de porta-vozes, “media-training” e preparação de argumentos. A teoria da área identifica alguns pecados capitais na comunicação de incidentes: esperar para ver, tentar desqualificar o problema, dizer que está tudo sob controle ou que domina o conhecimento integral na questão, solicitar confiança, desacreditar publicamente os críticos. É preciso sempre fazer a diferença entre o perigo (intrínseco) e o risco (probabilidade).

Aliás, há uma migração crescente de abordagem de “gerenciamento de crise” para “gestão de riscos”. Esta “nova” visão é de uma filosofia de trabalho e não um foco em procedimentos e manuais, ainda que a documentação de processos possa ser importante para a padronização de contatos. E já que “risco zero não existe”, é preciso ter clareza e equilíbrio dos custos e benefícios de cada ação, onde então os riscos precisam ser conhecidos para serem controlados. Entre as necessidades de ponderação, está a própria falta de aceitação das organizações sobre a legitimidade da opinião dos outros e a tendência a decidir sobre os sentimentos alheios, numa posição autoritária que não tem mais espaço. Outro ponto que merece debate é a prática equivocada de comparar riscos, esquecendo-se de toda a complexidade de contexto que envolve cada situação. Mas isto é tema para outro dia de conversa.


Rodrigo Cogo é profissional de relações públicas (Conrerp SP/PR 3674) e especializando em Gestão Estratégica da Comunicação Organizacional e RP pela Escola de Comunicações e Artes da USP. Gerencia o Portal Mundo das Relações Públicas (www.mundorp.com.br) e canais coligados – boletim por email, lista de discussão, micro-blogging Twitter, canal de vídeos YouTube, canal de favoritos Delicious e comunidade no Orkut. É analista da Ideafix Pesquisas Corporativas e produtor de conteúdo dos canais da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (www.aberje.com.br).

6 comentários:

J.Estel Santiago disse...

Muito interessante o texto! Acabei de passar por essa temática em Planejamento em RP II, e mesmo assim pude ampliar minha visão sobre gerenciamento/prevenção de crises com o teu texto, Rodrigo! Valeu!

Gisele Lorenzetti disse...

Rodrigo,
Uma aula sobre gerenciamento de crise. Excelente, professor! Venha sempre nos brindar com sua didática.
Abraços

Alexandre disse...

Parabéns pelo texto.
Muito pertinente a discussão.

Cibele Silva disse...

Ótimo texto Rodrigo.
A parte que vcocê citou dos 5 elementos, lembrei das aulas da professora e sua amiga Jocélia. Os dois tem o mesmo dom de ensinar clara e objetivamente.
Como disse a Gisele, você é um excelente professor.

abraços,
Belle
(A Bordo)

Unknown disse...

Concordo com você, Rodrigo. Hoje em dia o ponto de partida tem que ser gestão de riscos, não as crises em si.

Rodrigo Cogo disse...

Agradeço demais todos os comentários, e vou confessar que especialmente os incentivos sobre este "perfil de professor", que de fato é minha próxima busca profissional.

Reconheço que tive sorte, neste ano, de participar de algumas atividades sobre o tema, seja no curso da Aberje com Eduardo Prestes, na palestra no GestCorp com Waltemir de Melo e ainda com o curso internacional com o espanhol Javier Puig, que trouxe esta visão de gerenciamento de RISCOS. Bom demais poder dividir isto com vocês aqui neste canal.