quarta-feira, 20 de outubro de 2010

RPs, we have a problem!

Gisele Lorenzetti (*)

Este espaço sempre foi usado para disseminar informações com o objetivo de ajudar instituições a valorizar a boa comunicação nos momentos de crise. Ou seja, é um espaço em que profissionais de comunicação falam para o mercado. Então, quero pedir licença ao mercado e usar o espaço para falar aos profissionais de comunicação:

Colegas, acho que estamos em crise. Acho que está na hora de usarmos a expressão “Houston, we have a problem” para nós mesmos.

Há semanas venho amadurecendo a redação deste post. Mas hoje, um fato novo me obrigou a sair do campo das ideias. O professor João Manuel Cardoso de Mello, fundador da FACAMP e também da UNICAMP, numa entrevista para o portal da FACAMP, declarou, de maneira infeliz, que Relações Públicas é um “curso de segunda categoria”. Trata-se de uma declaração que, entre outras coisas, demonstra desconhecimento do que é a atividade de relações públicas. Ou seja, é uma visão preconceituosa, pois parte de um pré-conceito e não do conhecimento real do quanto à atividade de RP vem ganhando destaque.

Mas, não vou utilizar este espaço para condenar o professor João Manuel. Como profissional de RP que sou, em vez de reagir, prefiro pensar e compor um cenário. Conheço o professor em questão e sei que se trata de um profissional sério, dono de iniciativas mais que louváveis e de excelente preparo acadêmico e intelectual. Assim, utilizarei seu depoimento para compor um diagnóstico, baseado no seguinte questionamento: por que existe esta percepção no mercado?

Vamos por partes:

Em primeiro lugar, vou tentar definir “quem somos” e o “que fazemos”. A definição formal de relações públicas é “o esforço deliberado, planificado, coeso e contínuo da alta administração, para estabelecer e manter uma compreensão mútua entre uma organização, pública ou privada, e seu pessoal, assim como entre essa organização e todos os grupos aos quais está ligada, direta ou indiretamente”.

Sendo mais clara, direta e buscando uma definição alinhada à era das redes sociais, não erramos quando nos apresentamos como gestores de relacionamentos. Simples e complexo como isso. Afinal, promover o diálogo é buscar a compreensão mútua.

Além disso, a atividade de gestores de relacionamento nunca esteve tão em alta como nos dias de hoje. E, podem acreditar, isso não é um discurso apaixonado é, sim, fato. Exemplos: segundo o IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), a definição de governança corporativa é a de um sistema de gestão que envolve os relacionamentos entre a organização e alguns stakeholders. Ops! Gestão de relacionamento!

Mais um exemplo: a publicação “150 melhores empresas para você trabalhar”, editada anualmente pelas revistas Você S/A e Exame, tem dois indicadores que só podem ser avaliados à luz da comunicação. O quanto a empresa é capaz de disseminar sua estratégia para o público interno, no quesito estratégia e gestão, e a avaliação da relação empresa com o público interno, no quesito cidadania empresarial. Ops! Gestão de relacionamento, novamente.

E, para não ficar aqui linha, após linha, comprovando o quanto a atividade cresce em importância, vamos ao argumento fatal: na era das redes sociais percebemos que a comunicação one-to-one passa a ter uma relevância jamais imaginada. Ou seja, a comunicação de massa cede espaço ao diálogo com grupos de interesse e com o indivíduo. Isso é a essência de RP. Isso é gestão de relacionamentos.

Há outro ponto que eu gostaria de usar como provocação: na década de 80, fez muito sucesso o filme Blade Runner. Com uma visão futurista de uma Los Angeles no ano de 2019, o filme ficou marcado pela criação de robôs, considerados perfeitos: os Replicantes. Descobre-se, no entanto que estes seres robóticos possuem uma instabilidade emocional, diretamente relacionada à sua ausência de passado, de trajetória. No desenrolar do filme, percebemos estas figuras buscando preencher essas lacunas, observando fotos da trajetória real dos humanos. Certamente, quem assistiu a este filme guardou na memória a belíssima trilha composta por Vangelis...

Mas, voltando ao mundo real, em outubro de 2010, você deve estar se perguntando: “Mas Gisele, o que os Replicantes têm a ver com o nosso contexto?”. Tudo a ver. Nós, os RPs, não somos Replicantes. Ou seja, temos trajetória. Fazemos gestão de relacionamento há muito tempo, muito antes do advento das redes sociais e das comunidades virtuais. Temos história e raiz.

Então, meus colegas, se nossa atividade tem esta importância toda, por que vemos manifestações como a que comentamos na abertura deste post? Deixo a pergunta no ar para que possamos construir a resposta de forma coletiva, como mandam as redes sociais. Na semana que vem, prometo um novo post tentando trazer respostas e conclusões para o tema.

De qualquer forma, o objetivo deste texto era mostrar que a atividade de RP é relevante, vem crescendo em importância e isso não deve parar. Além disso, trata-se de uma atividade consistente, com passado, com trajetória e, por isso, capaz de acompanhar todos os movimentos e tendências sociais e empresariais.

E vamos ao segundo post: por que não somos reconhecidos como gestores de relacionamento e, portanto, como profissionais cada vez mais presentes nas organizações contemporâneas que prezam o relacionamento com os stakeholders, de forma sistemática e transparente?

Gisele Lorenzetti é profissional de Relações Públicas e diretora executiva da LVBA Comunicação. Foi conselheira do Conrerp-2ª Região (Conselho Regional de Profissional de Relações Públicas) durante três gestões e fundadora e diretora da Abracom (Associação Brasileira das Agências de Comunicação).

16 comentários:

Bruno Carramenha disse...

Gi, achei perfeito seu texto, como sempre. E tenho algumas apostas pessoais para esses questionamentos: acho, sinceramente, que falta um plano de ações feroz (e não acho que estou exagerando ao usar essa palavra) para a valorização da nossa profissão.

Não tenho dúvida da importância estratégica da comunicação nas organizações e tenho percebido que, cada vez menos as empresas têm essa dúvida. O fato é que essa função de gestor de relacionamentos muitas vezes é delegada a profissionais de outras formações e eu não acho ruim isso, afinal sou contra a reserva de mercado! Mas acontece que, como relações públicas, formados para exercer essas atividades, muitas vezes não somos lembrados como realizadores desses benefícios para as organizações. E, me parece, que a infelicidade do professor João Manuel Cardoso de Mello está justamente aí.

Eu duvido que um profissional que se mantenha minimamente atualizado sobre a rotina de uma empresa ache que a FUNÇÃO (aquilo que nós conhecemos) de relações públicas seja de segunda linha. O que é muito provável é que ele ache que o PROFISSIONAL não tem muito a contribuir – e, neste caso, por pura ignorância dele.

Não é raro ouvir de colegas RPs que ocupam funções superestratégicas nas empresas em que trabalham que eles recebem um torção de nariz cada vez que dizem que são formados em RP. Por quê? Na minha visão porque FALTA CONHECIMENTO ACERCA DA NOSSA FORMAÇÃO e não da contribuição estratégica da comunicação para as organizações. Esse é meu ponto.

Defendo fortemente que as associações de classe que nos representam deveriam se unir – efetivamente – para construir um planejamento agressivo de valorização da profissão. Não no sentido de dizer quão estratégicos nós podemos ser, mas sim que essa função estratégica, que as empresas já sabem que têm carência, pode muito bem ser desenvolvida por um profissional de RP, porque estudamos e nos formamos para isso.

Anônimo disse...

post maravilhoso! parabéns!

sobre isso tudo, no meu humilde pensamento, resumindo (RESUMINDO MUITO):
fazemos relações públicas sim.
mas como é mais fácil dizer que trabalhamos com 'marketing', ou 'assessoria de imprensa', ou qualquer outro termo que demande menos explicações e mais entendimento, não fica claro RP.

sim, falo de entendimento! as pessoas não entendem o que são relações públicas.
pq? não me atrevo a chutar causas, estou investigando ainda...
o que faço é errado? sim! mas procuro simplificar...

p.s. lembrando que atuo há pouquíssimo tempo na área e noto uma escassez de vagas com tal denominação... ou então vaga para rp, mas que demande muita muita muita experiência (coisa que estou correndo atrás no momento)

Maylime disse...

Bruno e Gisele,
perto da formação de vocês ainda estou muito aquém para tecer comentários tão profundos. Mas, como boa "quase-formanda" que sou, terminando meu projeto experimental tenho exemplos reais e vi, no meu cliente e nos meu trabalho, exemplos maravilhosos da atuação do Relações Públicas.

Já falamos sobre comunicação e sobre a que o projeto vinha acrescentar para a Instituição. Nem bem entregamos o Projeto e mostramos os resultados a eles, conhecemos a mais nova RP que trabalha com eles e hoje, em mais uma reunião, pudemos trocar muito sobre os novos rumos do cliente em termos de comunicação.

E mais: Trabalho com Orquestras e junto à minha chefia e outros Produtores coordenamos uma equipe de, em média 20 a 25 pessoas, estagiários de RP em sua maioria, que muitas vezes, não entende o significado que existe por trás de atender o público, resolver demandas, orientar e educar os novos e por aí vai. Pois que vou a livraria e vejo "Atendimento Nota 10", de Sextante, da Performance Research Associates.

E lendo este livro é que encontro frases como essa (2008, p.17): "Os pesquisadores são categóricos ao afirmar que custa cinco vezes mais atrair um novo cliente do que manter um antigo. Mas muitas empresas pensam apenas em realizar a venda, e não em construir um relacionamento de longo prazo."

Está aí, novamente! Relacionamento. Que tem a ver com atendimento, que tem a ver com comunicação, que por sua vez, olha só, tem a ver com Relações Públicas. Mostrei isso a equipe de estagiários que trabalha comigo.

Enfim, como sempre para falar de algo temos que saber como esse algo funciona. Por isso que eu, Bruno e Gisele e mais muitos RP´s estudamos, vamos beber de fonte da comunicação de outros países, outras faculdades e outros RP´s. Sempre para aprender mais e, com a paixão que temos pelo que fazemos, explicar, defender, amar e principalmente trabalhar.

Livro: Atendimento Nota 10 - Performance Research Associates. Editora Sextante.
19,90 preço médio

Thais Catucci disse...

Olá Gi, tudo bem?
Parabéns pela qualidade do texto, excelente!

E vamos continuar a defender a nossa profissão! Sou RP com orgulho!

bjos
Thais

Anônimo disse...

Temos alguns posts secundários aqui, não é mesmo?

Mas queria perguntar, como se faz para, nos comentários de um post, se aplaudir em pé o escritor?

Muito boa a análise, Gisele. Pegar pontos delicados, como o nos fazer voltar ao passado as raízes das RPs para buscar respostas e embasamento, é importante para interiorizarmos também que devemos agir sempre. Devemos pensar, planejar e agir constantemente.

Parabéns!

Pedro Prochno
@prochno
http://relacoes.wordpress.com

Alexandre disse...

Gisele,

Parabéns pelo texto e reflexão. Muito inteligente a análise sobre o passado, o presente e o futuro das RPs.
Como escrevi, o que mais me entristeceu foi o fato de tal declaração ter partido de um profissional, como você mesmo disse, sério, dono de iniciativas mais que louváveis e de excelente preparo acadêmico e intelectual.
Abraços,
Alexandre Costa
@alexandre_amc

Cristina Okuma disse...

Mas essa discussão não acaba mesmo.

Sou aluna de RP e estou no 4º semestre. A Gisele esteve na minha faculdade para discutirmos as novas diretrizes do curso de RP e o fato de Relações Públicas ainda não ter uma "identidade" formada nos deixa muito preocupados. E é uma pena as pessoas e empresas não conhecerem o valor de um RP na sociedade.
Lembro me bem das palavras da Gisele: "O Relações Públicas é o especialista em gestão de relacionamentos."

Fico triste em saber que um professor, um fundador de ótima universidade tenha um pensamento tão ignorante sobre RP, não estou falando mal dele, só acredito que ele ignore a importancia do profissional de Relações Públicas.

Outra frase que eu também não me esqueço: "Devemos ser Rps de Relações Públicas", o que não deixa de ser verdade.

Ótimo post Gisele

Cristina Okuma

Anônimo disse...

Olá, sou aluna da Veris (Metrocamp) e estou no 8º semestre de Relações Públicas.
Fiquei indignada com a entrevista do Sr. João Manuel Cardoso de Mello.
Fiz questão de reclamar no site da Facamp. Espero que chegue à ele.
Obrigada por tudo que escreveu, é de grande valia reforçar sempre o nosso valor que brilhará sempre!

Unknown disse...

Gisele ,é lindo o que você escreveu, maravilhoso, pois não é a realidade;
Talvez no seu mundo seja,mas sinto em lhe dizer ,as empresas quando precisam de uma ação de RP o própio setor de marketing o faz,o RH faz,aí você talvez fale :faz com eficacia e efciencia...acho que si,
Sou contra o Curso de RP,acho uma balela,acordei no terceiro ano.Pra mim deveria virar um curso de 2 anos ou fazer parte de um outro curso,aí sim funciona.
Me arrependo quando não escutei meu amigo, quando estava fazendo a matrícula na faculdade dizendo:Caía fora,pois esse curso é furado..
Na minha antiga classe estõ todos arrependidos,irá se formar porque não há outra opção, pois não pularam do barco antes.
Concordo com genero e grau com o Prof, o curso é segundário sim, o famoso pra casar.
Desculpe mais é isso que penso,sei que não irá publicar,mas é que o seu discurso é o mesmo de todas as minhas professoras,talvez está na hora das Alices acordarem ....

Abrçs

Anônimo disse...

Olá Gisele,
Como sempre, um ótimo texto. Sou formada em RP a quase 11 anos pela FAAP e lembro até hoje de ter ouvido de uma professora, em sala de aula, após uma "revolta" dos alunos de serem chamados de "contador de coxinha", que a culpa de não termos nossa profissão com o devido reconhecimento de importância por nossa culpa. Fazemos pelos "outros" (clientes, chefes...) mas não fazemos para o reconhecimento de nossa carreira.
Hoje vejo que ela tinha razão.
Achei infeliz o comentário do professor em questão, mas quem sabe não serve para que comecemos a dilvugar melhor nossa importância e título?
Afinal, todos sabem o que um médico, advogado, engenheiro e até nossos colegas publicitários e jornalistas fazem.
Obrigada!
Ana Luiza Viola

Anônimo disse...

Me chamo Leonardo Amaral,
estou no 4 semestre de Comunicação Social - Relações Públicas.

Primeiramente parabéns Gisele pelo texto. Pesquisei varios sites, e com base em pesquisas dos mesmos, estamos em uma das carreiras mais promissoras.

Enquanto ao infeliz comentário do prof. Joao Manuel, veio lhes informar que nosso conselho profissional (CONRERP), já está tomando as providências legais cabíveis.

Obrigado.

Anônimo disse...

Para quem tem duvidas, referente a atividade de RP,
segue o link com a carta do conselho profissional de RP, ao prof Joao Manuel Cardoso de Mello

http://xa.yimg.com/kq/groups/24057993/103166564/name/carta.pdf

Anônimo disse...

a

Anônimo disse...

CARTA CONRERP

desculpe o transtorno

Julyana Castro disse...

Olá Gisele!!

Bom, serei mais uma a elogiar o ótimo post! Realmente fica presa na garganta a vontade de gritar a todos, quem somos, o que fazemos e a importância que temos na gestão das organizações!
Fico muito irritada com a falta de valorização da nossa profissão, na verdade o que acontece é a falta de conhecimento. É estressante quando alguém pergunta: Qual é a sua formação? E respondemos: Relações Públicas! E temos que ouvir: Ahhh, mas vc faz o que?
Enfim, fica registrada aqui a minha indignação em relação ao desconhecimento e falta de valorização de uma profissão tão importante como a nossa, afinal como as empresas sobrevivem sem seus relacionamentos? E quem os administra?
O importante é que ainda existem pessoas informadas como nós e que levam a diante essa profissão que considero a mais completa da área da Comunicação!
Bjs,
Julyana Castro

Rodrigo Capella disse...

Gisele,

ótimo texto e reflexão interessante!

Abs e parabéns,
Rodrigo Capella.
http://printerview.wordpress.com