quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Conhecimento e Interconexão dos fatos

Quando falamos em crise e o papel da comunicação é muito natural nos lembrarmos de diversos cases expressivos nos mundos dos negócios, tais como escândalos, catástrofes ou acidentes que às vezes marcam a história de algumas organizações. Porém, definitivamente, crise não é só isso. Elas são de todo tamanho e acontecem diariamente. Pode ser o desligamento de um funcionário estratégico, um conflito de interesses entre áreas, uma reestruturação organizacional, o avanço de mercado de um concorrente audacioso... Enfim, qualquer situação de ruptura e/ou mudança que demanda decisões ágeis e importantes.

A própria palavra “crise” significa isso: “um momento de grande perigo, dificuldade ou confusão quando problemas precisam ser solucionados ou decisões importantes precisam ser tomadas” (tradução do Oxford Dictionary). A palavra, tanto no inglês quanto no português, deriva do grego Krisis, que significa “ação ou faculdade de distinguir e tomar decisão, por extensão é o momento decisivo, difícil de separar, decidir, julgar” (Dicionário da Língua Portuguesa, Houaiss). Tudo isso pode até parecer muito teórico, mas realmente vale a pena entender o que a palavra realmente significa, porque podemos ampliar nossa percepção e visão. E crises não são necessariamente apenas situações alarmantes. São os momentos de juízo, decisão, quando é necessário fazer escolhas. E, aqui entre nós, um significado muito mais positivo e inspirador, pois nos coloca no centro da situação como protagonistas das decisões e não simplesmente um refém dos fatos.

No entanto, é importante ter consciência de que “tomar decisões” hoje é muito mais complexo, pois normalmente é preciso agilidade, ao mesmo tempo em que são muitas variáveis a ponderar e equilibrar nesse processo. Acredito que aqui está o grande desafio! Afinal, raríssimas situações que enfrentamos tem uma simples e única causa pontual para cada uma delas. Precisamos ter e desenvolver o pensamento sistêmico, ou seja, efetivamente pensar em rede e conseguir ver rapidamente a interligação dos fatos, mesmo sem todos os detalhes. “O pensamento sistêmico é uma sensibilidade à sutil interconectividade que dá aos sistemas vivos seu caráter único” (SENGE, 1990).

Ok! Falar que precisa de “pensamento sistêmico” parece mais um jargão do mundo corporativo, porém difícil de concretizar. Para exemplificar gosto muito de fazer uma analogia com seriados de TV. Você se lembra do seriado “A Feiticeira” da década de 60? Que tratava do dia a dia de uma dona de casa americana com poderes paranormais... Tudo bem, não é o tema em si que é o mais importante na analogia, mas a forma como o enredo se desenrola. Estamos falando de uma história linear, com começo, meio e fim, em um contexto com apenas uma variável complexa: os poderes da protagonista. Com certeza fazia muito mais sentido ver o mundo dessa maneira e até mesmo o planejamento de negócios e de comunicação seguia esse tipo de modelo mental.

Agora, você já assistiu “Lost”? Sim? Então bem-vindo à nossa realidade atual. Não que estejamos literalmente perdidos, não é este o caso. Mas certamente estamos em uma realidade que pode ser melhor representada em rede, tal como acontece no seriado. As histórias dos personagens são todas interconectadas, mesmo antes de eles se conhecerem. E cada passo, cada fato que acontece com um dos personagens, ou em uma parte da ilha, gera impactos em todos os outros e em todo o sistema. (confesso que sou uma dessas viciadas no seriado Lost, apesar de realmente não fazer muito sentido).

A analogia serve para exemplificar o que acontece nos sistemas organizacionais, pois, provavelmente, as decisões mais importantes que precisam ser tomadas não dependem de correlações simples e de efeitos lineares de curto prazo. Na complexidade dinâmica, presente em nossa realidade atual, os efeitos são distintos a curto e longo prazo, as conseqüências são diferentes nas diversas partes do sistema e as intervenções óbvias produzem conseqüências não-óbvias.

Para dar conta do recado, não tem solução mágica. O único remédio é o conhecimento efetivo! Entender de negócios, de sociedade, de pessoas e do que acontece no mundo. E, com isso, ser capaz de identificar os pontos principais e quais são as informações essenciais e fazer as interconexões entre os fatos, mesmo sem ter todos os detalhes. A essência está em ver o todo e descobrir as causas subjacentes dos problemas no sistema. Aí sim combater a causa raiz. Acredito que é esta competência que fará diferença para o profissional, independente de sua escolha como especialista em alguma área específica da comunicação ou como gestor da comunicação ou de qualquer área da organização. E fundamental para tomar as decisões mais acertadas e coerentes nos diversos momentos decisivos, de perigo ou não. Mas, com certeza, não é fácil (e ninguém disse que seria).


Juliana Rodrigues, Relações Públicas, com mais de 10 anos de experiência na área. Atualmente é Gerente de Projetos relacionados a sistemas de gestão e indicadores na International Paper. Também é professora de “Gerenciamento de Comunicação Organizacional” na Faculdade Casper Líbero.

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